“Parecia-lhe que algo sombrio pairava sobre ele, algo de angustiante. Ele voltou a sentar-se num banco. As carruagens continuavam a passar rapidamente. “Teria feito melhor em não vir aqui”, pensava, “pois sinto-me algo transtornado”. Pôs-se a pensar em todo este amor, venal ou apaixonado, em todos estes beijos, pagos ou gratuitos, que desfilavam diante de si.
O amor! Ele não o conhecia minimamente. Não tinha tido na sua vida senão duas ou três mulheres, por acaso, imprevisivelmente, pois as suas posses não lhe permitiam mais extravagâncias. E reflectia sobre essa vida que tinha levado, tão diferente da vida de todos os outros, essa vida tão sombria, tão triste, tão chata, tão vazia.
Há seres que não têm mesmo nenhuma oportunidade. E, de repente, como se um véu espesso se tivesse rasgado, apercebeu-se da miséria, da miséria infinita e monótona da sua existência: a miséria do passado, a do presente, a do futuro. Os últimos dias semelhantes aos primeiros, sem nada à sua frente, nada atrás de si, nada em seu redor, nada no coração, nada em parte alguma.”
d’O Passeio, em O Abandonado e Outros Contos, do Guy de Maupassant.